quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Um mês de Ásia

Hoje é dia 12 de fevereiro. Amanhã é aniversário do Terezo e depois da Juju, ou o contrário. Nunca fui bom com datas, mas sempre os carrego aqui num lugar bem confortável do peito, primos-irmãos mais que queridos. Terezo teve filho outro dia, Pedro, não pude lhe dar as mãos ou um carinho sequer. Com Juju tive encontro recente, parece que foi ontem, mas lá se vão quase cinco meses. Me enche todo de orgulho com o seu francês de francês e aquela sensação do dever cumprido lá do outro lado do oceano. E assim como Juju e Terezo, tantos outros queridos e tantas outras datas têm simplesmente passado. O carnaval vem aí, o Cruzeiro foi campeão, o Galo fez feio no Marrocos, a PM continua uma merda, o Lacerda rima, Mamis e Papis fizeram 32 de casados e eu aqui, ainda na estrada, tão perto e tão longe de quando ainda há de chegar um final.

Hoje, completo um mês aqui na Ásia e lá se vão 140 dias na estrada. Dois continentes, oito países e mais ou menos umas trinta cidades. Hoje, faço um mês de Ásia e nunca me senti tão bem. Não sei como explicar, se é que há explicação pra certas coisas do coração, mas estou diferente de ontem e o amanhã nunca esteve tão distante e próximo e misterioso ao mesmo tempo. Se tivesse que nomear, talvez chamasse transformação. O tempo da Ásia me faz um cara melhor, me faz ver o mundo e as pessoas de outra maneira, com certa dose de simplicidade e a certeza de um dever jamais cumprido. Nos três meses bons que tive na Europa, conheci muitos lugares e poucas pessoas. Talvez pelo inglês ruim, talvez pela aparante timidez que transparecia quando me assentava sozinho ao fundo do restaurante sem que quisesse ser visto, talvez pelo frio ou porque eu precisasse mesmo de algum tempo para refletir sobre qualquer coisa que fosse. Em todas as vezes em que chorei, sorri, sofri ou me amedrontei com o que o destino me reservava, nunca imaginei que um dia fosse parar num lugar tão distante e feliz. Indonésia. Bali. Ubud. Tão longe de casa, tão perto de mim.

Na próxima semana, volto para a Tailândia. Na outra, talvez vá para o Laos. Amigos queridos hão de ser bem-vindos nessa parte do caminho, ou o contrário, porque a invasão nesse caso é minha. O mundo é de todo mundo, todo meu, todo seu, nosso, ou ao menos deveria ser, e essa viagem é tampouco só minha. É dela própria e traz consigo todas as questões que porventura tentei me esquivar no passado, ou num passado não tão distante, o destino conduz as coisas à sua maneira com maestria e tem me proporcionado quantos anjos ou companheiros lhe forem convenientes. E com vigor. Ontem, conheci pessoas. Anteontem, não. Hoje, mais amigos se foram. Amanhã, não sei. Essa é uma das melhores partes: o não saber quase nada. Às vezes, quero escrever, outras vezes não, na maioria do tempo quero simplesmente encontrar um caminho. Não sei se encontrei, mas as minhas escolhas têm me feito um bem danado até agora. E mesmo que eu saiba muito pouco, sei que estou aqui, agora e sinto que preciso ser, e tão somente, e esse tempo impreciso tem me permitido mais leve.

Ontem, fiz aula de culinária balinesa. Fiquei bêbado outro dia e tenho visto muitos vídeos de carnaval. Pena de Pavão de Krishna é o meu preferido. Já conheci templos, arrozais e tomei o café mais caro do mundo, que sai do cocô de um bicho tipo o furão. Estou na minha pousada agora. Decidi ficar em um lugar mais caro por alguns dias, se é que cinquenta reais por um lugar gostoso com ar-condicionado, silêncio, piscina e café da manhã pode ser considerado caro. Aqui, escrevo. Comprei um Buda amarelo e outro vermelho, acho que um pouco do que tenho aprendido tem a ver com isso: à nossa maneira sempre vale mais à pena. Mais coração, menos razão. Tenho tentado segui-lo, mesmo clichê, e me permitido errar no meio do caminho quantas vezes forem necessárias. Hoje, faço um mês de Ásia, mas parece que não. Na próxima semana, cinco meses de viagem. E depois não sei.

Um comentário:

  1. "O meu olhar é nítido como um girassol.
    Tenho o costume de andar pelas estradas
    Olhando para a direita e para a esquerda,
    E de, vez em quando olhando para trás…
    E o que vejo a cada momento
    É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
    E eu sei dar por isso muito bem…

    Sei ter o pasmo essencial
    Que tem uma criança se, ao nascer,
    Reparasse que nascera deveras…
    Sinto-me nascido a cada momento
    Para a eterna novidade do Mundo…"

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