sexta-feira, 14 de março de 2014

Um dia de fúria

Na viagem, também temos dias de fúria. São mais raros do que o contrário, mas acontecem, e quando acontecem sai de baixo. Desde que cheguei a Bangkok, tem sido confusão atrás de confusão. Reencontrei amigos que não puderam embarcar porque não tinham visto para o país de destino, o calor tá de matar e é praticamente insuportável ficar na rua durante boa parte do dia, o curso de massagem que eu queria fazer é absurdamente caro para os padrões locais, os hostels e as guest houses são relativamente mais caras e menos confortáveis do que em outros lugares, todos dizem ter um milhão de coisas para se fazer aqui, e deve ter mesmo, mas nada tem me apetecido tanto.

Até aí tudo bem, bastasse mudar de cidade ou me dedicar um pouco à escrita, mas não posso porque o meu passaporte está retido em uma Embaixada. O máximo que posso é fazer uma excursão até a cidadezinha ao lado, que não descarto de modo algum. Bangkok é bonita, maluca, grande, mas talvez tivesse me encantado mais se tivesse sido a minha porta de entrada nessa parte do mundo, mas já fui alguns outros lugares da Tailândia, à Indonésia e ao Laos, então passa a não ter tanta graça quanto pudesse. Há muito o que se fazer aqui, mas como estou de partida para a Índia e o Nepal em breve, lugares que sempre sonhei, pensei que aqui pudesse ser um bom pit stop para organizar algumas coisinhas, principalmente no Brasil, e ter mais acesso às necessidades básicas do dia-a-dia, como a internet.

E é aí que tudo começou. Além de paga na maioria dos lugares, é horrível. O site do Banco do Brasil, que é era muito bom e nunca tinha falhado até aqui, resolveu ter um novo sistema de segurança que simplesmente não funciona no meu computador, a Unimed resolveu aumentar o valor do meu plano e exigir uma assinatura para a continuidade, as contas estão atrasadas, tenho que pagar o IPVA e as coisas do carro que está lá quietinho na garagem, realmente gostaria de poder pesquisar um pouco mais sobre a Índia antes de me arriscar por lá, que dizem ser danada de complicada, gostaria também de poder matar a saudade de algumas pessoas, mas o Skype não rola nem por telepatia.

A viagem é boa, está boa, é transformadora e eu não estou triste, longe disso e talvez esse post soe muito como #classemédiasofre, mas às vezes tenho alguns dias de fúria mesmo, que me perdoe essa culpa que recai sobre as minhas costas agora. Tive todas as senhas bloqueadas, tanto da internet quanto do telefone, tenho um milhão de coisas para fazer que dependo do banco e da internet e estou praticamente anulado. De quebra, o banco só oferece duas opções para entrar em contato do estrangeiro: o 0800 (que é impossível e não funciona em nenhum lugar do mundo) e um número que dizem poder ligar a cobrar, mas que exige uma senha que eu tenho e agora dizem também estar bloqueada e que devo ir a um caixa eletrônico do Banco do Brasil para resolver... aqui, nem sabem muito bem aonde fica o Brasil.

A sorte é que ainda tenho algum dinheiro e muitas pessoas que podem me ajudar no Brasil  (Val, Julia e Pai, obrigado!!!). Fazer novos amigos em Bangkok também tem sido difícil, o ritmo da cidade é frenético e quase todo mundo está aqui de passagem. Aos que vivem, valem-lhe outras opções além do circuito turístico, difícil de serem descobertas, quiçá exploradas. A solidão às vezes é um abandono e recorrer ao blog talvez faça bem. Acho que já passei da metade da viagem, mas ainda tem muito chão pela frente. Sei que é um dia após o outro, que ainda virão coisas maravilhosas e que este não é um problema tão grande assim, inclusive consegui postar esse texto (depois de algumas horas, é verdade) e juro que não vou reclamar mais, isso aqui é um presente de Deus! Mas, quando se está do outro lado do mundo e não há nada de pró-atividade que lhe seja suficiente, aí o bicho pega e o choro vem. Impotência e inoperância transformam-te um dia de céu azul e pôr do sol laranja em um dia do cão.

Pra amenizar, fui lá e fiz uma nova tattoo... Simples assim. A foto não está tão boa, coisas da emoção do momento, mas está escrito “sabaidee” que, em Laos, é uma espécie de Oi/Olá no sentido de saudação. Se pronuncia "sabaideeeee" e é uma delícia de ser falado e ouvido. A escolhi não apenas pela grafia bonita => ສະບາຍດີ <= e pela sonoridade mais linda da vida, mas também por ter conhecido as pessoas mais dóceis da minha vida por lá. Num país de apenas poucos milhões de habitantes, o que não lhes falta é um bom sorriso no rosto e boa vontade ininterrupta. Amei aquela gente, aquele povo, aquelas paisagens, tive o pôr-do-sol mais bonito da minha vida, fiz bons amigos, tentei domar um elefante e tudo o que já contei outro dia por aqui, e agora carrego mais essa parte do mundo comigo. E é pra sempre.


Sabaidee!!!
=)

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