terça-feira, 13 de janeiro de 2015

depois da viagem...

a viagem nunca acaba e essa é a minha primeira constatação depois da volta. faz quatro meses que estou de volta para casa e, muito embora estranho, já não sei mais onde vivo. ainda tenho os meus móveis, o sofá que tanto adoro, as paredes vermelhas, as cadeiras amarelas, as inquietações que me assombravam desde sempre. o chuveiro estraga, as compras fazem falta, a faxineira vem, as contas não param de chegar, a luz queimou, o dinheiro acabou. foi preciso, uma hora, que decidisse trabalhar. e me dou bem nessa seara, é importante que se diga, pois ninguém se dá ao luxo de largar tudo e, quando da volta, lança um livro e arranja emprego em um dos maiores centros culturais da cidade, quiçá do país. agora, coordeno a programação de um centro cultural. tenho salário novamente, tenho rotina novamente, obrigações com terceiros a cumprir. e com isso me voltam as olheiras, a insonia (que me permite, agora, escrever esse texto tarde da noite), as preocupações, a falta de tempo para fazer as coisas que eu gostaria, a desatenção com os amigos, a necessidade de ligar mais para os pais, de saber como anda o sobrinho torto, a sobrinha inventada, os cursos, as palavras e os sonhos que antes me rondavam. voltei a ser o que era antes da viagem. assumo que isto seja um pouco eu também. ou muito, porque também não reclamo. ganho um salário, economizo certo dinheiro para os planos mais audaciosos, tenho um plano de saúde pago pela empresa e tenho novos amigos também, talvez a parte mais legal dessa nova aventura. mas é estranho ter de reconhecer que, depois de dois anos, volto de certa maneira ao que estava antes. alguns quilos a mais, cabelos brancos que não param de surgir, a necessidade de ir para o campo. de voltar pra campo. de pegar a mochila e não saber o que será o dia de amanhã. não sei mais onde moro, não sei mais quem é esse que reside em mim, não sei o que me falta. "faz mais presença em mim o que me falta". talvez seja isso. temo pelo amanhã, como antes talvez não imaginasse. espero pelo carnaval, como se todos os dias não fossem uma celebração. deveriam ser. era para ser assim. mas, não. me sinto parado no tempo de novo. sei que daqui a pouco a viagem volta, movimentação constante, a estrada é o caminho. esse intervalo entre um sonho e outro tem me custado muito caro. já estou desprovido de reações, não sei até que ponto o dinheiro vale alguns dias do resto da minha vida. vou dormir porque amanhã tem mais. reunião às nove, pautas da semana. estou preocupado com a gordurinha a mais. 

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